sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Embriagado de Amor


Embriagado de Amor (Punch-Drunk Love, EUA, 2002) Direção de Paul Thomas Anderson. Com Adam Sandler, Emily Watson, Philip Seymour Hoffman, Jason Andrews, Don McManus, Luis Guzmán.


Renato Cordeiro

Quem assistir Embriagado de Amor esperando uma comédia romântica comum vai se dar mal. Não que o filme careça de situações clássicas do gênero, mas o longa trata estes elementos criando rupturas. Se as produções do tipo se caracterizam pelas situações forçosas e inverossímeis, aqui são reunidas passagens que podem parecer inusitadas, mas não surreais. Um piano é abandonado no meio da rua no início da trama sem qualquer explicação, da mesma forma como provavelmente quem assistisse a cena na vida real se intrigaria, de fato. O protagonista esquece o número do apartamento da amada e corre por vários andares tentando lembrar qual a porta certa, como certamente aconteceria com um idiota apaixonado que não quer causar má impressão. Ao encontrá-la, a dor vai embora, uma música triunfante parece tocar dentro do peito. Como na vida real.

A direção de Paul Thomas Anderson acentua a desglamourização do personagem de Adam Sandler, que dá vida ao vendedor Barry Egan em interpretação correta e sem afetações. Em dado momento, o sujeito com problemas de autoestima liga para um desses serviços de sexo por telefone. Ele fica constrangido, só quer uma conversa normal com alguém que afaste a carência e ao sentar à mesa da sala, a câmera, implacável, faz questão de se deslocar para mostrar que há uma cadeira vaga, enquanto Egan espera ser atendido. Em outra passagem, ele está no trabalho, recebendo clientes para os quais tenta vender um desentupidor. As irmãs o interrompem e a cada ligação Barry se afasta da câmera, se desloca ao telefone, torna-se menor, vai sendo oprimido pelas garotas da própria família. Antes de uma crise de choro, Egan desabafa com um cunhado e diz que não sabe se tem algo de errado, por que não faz idéia do que se passa com as outras pessoas.

A trilha sonora, por vezes, é de uma percussão que parece propositadamente irritante, como se ditasse o ritmo da palpitação do homem que é dado a acessos de fúria. A mão do cineasta pode ser um pouco pesada demais ao retratar a agonia do protagonista, mas parece haver aí um caminho necessário a ser trilhado para que o espectador compreenda as mudanças que estão em jogo. Esse personagem imperfeito, loser profissional que usa terno e gravata para parecer mais importante, se apaixona, e o amor passa a ser a mola propulsora de sua crescente conquista de autoconfiança. Ao enfrentar o vilão encarnado pelo ótimo Phillip Seymour Hoffman, Barry afirma que o amor o faz mais forte do que seu adversário pode imaginar. Maneira curiosa de intimidar alguém.

Aqui reside aquela que parece a mais importante diferença entre Embriagado de Amor e outras comédias românticas. Uma pesquisa chegou a apontar como longas do tipo podem fazer mal aos relacionamentos reais, ao venderem a idéia de que o amor verdadeiro opera milagres. Mas Lena Leonard, papel de Emily Watson, aceita Egan em todas as suas fraquezas, em toda sua imaturidade, sem forçar uma súbita mudança radical como condicionante da relação, algo que parece acontecer como mágica em outras produções. Ao fim do filme, que foi crescendo na mente depois de tê-lo visto, lembrei de uma senhora que já sofreu muito em relações amorosas e pareceu sintetizar bem esta situação, ao me dizer que o amor é o exercício do apesar de.

Nota: 7,0 (de dez)










3 comentários:

  1. Eu até concordo com tuas afirmações, renatão, mas o filme passou longe de conseguir um espaço na minha memória abarratoda.

    E também não achei que filmes como esse fazem mal aos relacionamentos. "Foi Apenas Um Sonho" é muito, mas muito mais problemático neste sentido. Assista ao lado de sua namorada e duas horas depois não entre em uma briga violenta, dúvido.

    ResponderExcluir
  2. Quando vi esse filme, inicialmente o rejeitei. Depois Embriagado de Amor foi crescendo na minha mente, fui revendo algumas cenas, acabei sentindo outras coisas. É ótimo que haja filmes que retratem os relacionamentos de forma menos ingênua, e olha que esse filme do P. T. Anderson é até bem otimista, por assim dizer.

    E como não vi Foi Apenas Um Sonho, prefiro não comentá-lo em específico. Mas independente da pesquisa, acho que faltam longas que tragam um discurso diferente sobre o desgaste dos relacionamentos, e que até possam abordar o fim como uma expressão de amor. Pra não contar spoilers, acho muito bom, neste sentido, 500 Dias Com Ela (Pra quem estiver lendo isso, calma, não é spoiler. O filme já começa com o término).

    ResponderExcluir